Limeira Mil Grau

Bebês funcionários? No Japão tem

Em diversas ocasiões escrevi que o Japão, com 29% da sua população acima dos 65 anos, é um laboratório sobre o envelhecimento que deveria ser observado por todos. Entre o fim de novembro e o começo de dezembro, tive a oportunidade de passar oito dias no país entrevistando especialistas e conhecendo iniciativas voltadas para uma longevidade ativa. Esta é a primeira de uma série de seis reportagens e quis começar com uma história encantadora, que sirva de inspiração para todos nós porque, como sociedade, podemos fazer muito mais pelos que envelheceram e envelhecerão.

Idosas e as “bebês funcionárias”: instituição criou iniciativa para estimular a convivência entre gerações — Foto: Mariza Tavares

As pequenas Kurumi, de pouco mais de um ano, e Rena, de nove meses, enfrentarão uma “aposentadoria compulsória” antes de completar três anos. Elas são “bebês funcionários” de uma instituição de longa permanência em Kitakyushu, cidade localizada no Sul do Japão, e sempre arrancam sorrisos – às vezes lágrimas – quando visitam os idosos. E ainda recebem “pagamento”: leite ou um pacotinho de fraldas embrulhadas para presente onde, além do nome de cada uma, está escrito: “salário”.

Kimie Gondo, dona da instituição há sete anos, é uma adepta da convivência entre gerações antes de o termo ganhar destaque nos estudos sobre longevidade, mas consolidou o que sua intuição lhe dizia ao fazer um mestrado sobre sistema social e relacionamento de pessoas. A residência também abriga cursos de reforço escolar para crianças, que já circulavam pelo local junto com os filhos dos funcionários, mas foi o nascimento da neta, em 2020, que lhe deu a ideia do “funcionário bebê”:

“Minha filha vinha quase todo dia e eu comecei a fazer adaptações no espaço para minha neta. Sua presença alegrava tanto os idosos que distribuímos folhetos pela vizinhança e usamos as redes sociais para divulgar que pais e mães poderiam levar seus bebês para interagir com os residentes. Em troca, eles recebem fraldas e leite. A única restrição é que tenham no máximo três anos. Quando começam a falar com desenvoltura, são ‘aposentados’”.

As pequenas Kurumi (à esquerda) e Rena brincam observadas pelos pais. No chão, no pacote de fralda está escrito “salário” em japonês — Foto: Mariza Tavares

Atualmente há quase 50 crianças inscritas, que podem aparecer quando quiserem. Na tarde de sábado em que visitei o local, o sol do fim de outono entrava generoso nos quartos espaçosos, com cômodas coloridas. As duas pequenas passearam pelo colo de idosas e brincaram como se estivessem em casa. A mãe de Kurumi, Kanae Kajiyama, estava acompanhada do marido, Kengo, e me contou que há seis meses frequenta o lugar: “é bom para ela, que não convive com idosos porque os avós moram longe, e eu posso conversar com outras mães”. Na mesma tarde, voluntárias que são alunas de um curso de dança da cidade se apresentaram, com direito a muitas palmas dos presentes: “aqui é sempre animado, e eu fico tão feliz quanto eles”, afirmou Kimie Gondo.

*A colunista viajou a convite do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Japão

Por: g1.globo.com

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