Uma equipe de pesquisadores concluiu a investigação mais completa até o momento sobre a erupção do vulcão Hunga Tonga-Hunga Ha’apai em Tonga, em janeiro de 2022
Por:CNN
Quando o vulcão Hunga Tonga-Hunga Ha’apai entrou em erupção em Tonga em janeiro de 2022, ele causou a maior erupção já registrada com a tecnologia moderna.
Estimada em centenas de vezes mais potente que a explosão nuclear de Hiroshima, ela foi ouvida até no Alasca, a mais de 10 mil km de distância. Uma nuvem de cinzas, fumaça e matéria vulcânica se avolumou por 58 quilômetros de altura e eventos com velocidade de furacão foram relatados na camada atmosférica mais alta da Terra, na
borda do espaço.
E depois vieram as ondas. Avisos de tsunami foram emitidos nas nações insulares próximas no Pacífico – Fiji, Samoa e Vanuatu – bem como em locais mais distantes, na Nova Zelândia, Japão, Peru, EUA e Canadá. O tsunami que se seguiu devastou Tonga com ondas de até 15 metros de altura, matando três pessoas e causando cerca de US$ 90,4 milhões (cerca de R$ 480 milhões) em prejuízos.
Uma equipe de pesquisadores acaba de concluir a investigação mais completa até o momento sobre o evento. Ela confirmou que quase 10 quilômetros quadrados de fundo do mar foram deslocados – o equivalente a 2,6 milhões de piscinas olímpicas, e um terço a mais do que as estimativas iniciais.
No entanto, eles descobriram que apenas três quartos deste material foi depositado em uma área a menos de 20 quilômetros do vulcão, deixando um pedaço considerável ainda não contabilizado. O Instituto Nacional de Pesquisa em Água e Atmosférica da Nova Zelândia (NIWA), que conduziu o estudo, acredita que esses detritos desaparecidos podem ser parcialmente explicados pela “perda aérea” – razão pela qual não ele ainda foi notado, aguardando a conclusão do mapeamento. O material foi atirado no céu e permaneceu na atmosfera, circulando por meses, o que explica não estar no fundo do mar.
Mas não está claro para os pesquisadores a exata razão de uma erupção tão explosiva. Algumas respostas vieram de uma expedição anterior também conduzida pelo NIWA, que mapeou o fundo do mar em torno do Hunga Tonga-Hunga Ha’apai.
Exploradora marítima
Erica Spain é uma técnica de geologia marinha no NIWA e membro da expedição que partiu em abril. Descrevendo-se como uma “detetive do leito marinho”, Spain usa máquinas de ecolocalização de alta tecnologia para caçar vulcões subaquáticos, e reúne pistas sobre os “gatilhos” que influenciam erupções subaquáticas.
A bordo do RV Tangaroa, navio de pesquisa do NIWA equipado com tecnologia de vigilância subaquática de última geração, Spain teve um papel duplo: operar a ecossonda multifeixe e colher amostras de lama e sedimentos rochosos do fundo do mar.
A ecossonda “envia pulsos acústicos para mapear o fundo do mar em 3D”, conta a especialista, comparando-a com a ecolocalização usada por golfinhos. “Temos hidrofones que recebem esse eco e, a partir disso, podemos determinar a profundidade do fundo do mar e construir uma ideia de sua forma e geometria”.
Com um cone vulcânico de apenas 100 metros de altura em uma pequena ilha no Pacífico, o vulcão Hunga Tonga-Hunga Ha’apai não era muito observado antes da erupção. Sob a superfície, porém, ele se estendia por mais de 20 quilômetros de largura e quase dois quilômetros de profundidade.
A instabilidade contínua na caldeira fez com que a tripulação não pudesse examinar a abertura do vulcão – e então foi enviado um navio de superfície não tripulado. Operado remotamente pelo SeaKit, com sede no Reino Unido, a 16 mil quilômetros de Tonga, o robô de 12 metros de comprimento descobriu que a caldeira havia desmoronado, e agora fica deitada a 700 metros abaixo da superfície.
No total, 22 mil quilômetros quadrados do fundo do mar foram escaneados. Partes do fundo do mar em torno do Hunga Tonga- Hunga Ha’apai já tinham sido mapeadas. Comparando os mapas do fundo do mar antes e depois da erupção, “podemos começar a construir uma imagem melhor do que esses gatilhos podem ser”, explica Spain.
Descobertas explosivas
De acordo com a técnica, os resultados da expedição surpreenderam a equipe. Eles esperavam que a enorme erupção tivesse deixado muitos detritos vulcânicos no fundo do mar, mas, na verdade, “o vulcão parecia muito semelhante ao que parecia décadas antes”.
Em vez de descansar no fundo do oceano, “uma grande parte desse material vulcânico acabou subindo diretamente para a estratosfera”, diz.
A discrepância entre o tamanho do colapso da caldeira e os detritos do fundo do mar apontou para outro fator na explosão: o magma quente do vulcão interagiu com a água do mar fria para criar vapor. “O vapor consome mil vezes mais volume do que a água. Em certa medida, isso explica por que a erupção foi tão explosiva”.
Os resultados dos dados coletados antes, durante e após a erupção apontaram para “múltiplos mecanismos” acontecendo simultaneamente, de acordo com Emily Lane, cientista hidrodinâmica do NIWA e membro do Painel de Especialistas em Tsunami da Nova Zelândia.
A erupção inicial explodiu a água em seu caminho, causando ondas localizadas. Mas as mudanças na pressão do ar reforçaram essas ondas criando um meteotsunami que viaja mais rápido do que a velocidade do som. No caso de Hunga Tonga-Hunga Ha’apai, ele gerou uma onda de pressão que viajou pelo mundo três ou quatro vezes”, detalha Lane.
As ondas também foram criadas por detritos vulcânicos que choveram no oceano e o colapso da caldeira.
O NIWA já possui um sistema de alerta de tsunami, com sensores no fundo do mar em torno da Nova Zelândia e do Pacífico Sul para monitorar os níveis do mar, marés e correntes, e para relatar anomalias. Agora, segundo Lane, os dados coletados de Tonga podem ajudar a refinar esses sensores.
“O evento realmente mudou nossa compreensão dos tsunamis vulcânicos porque esta é a primeira vez que conseguimos obter medições modernas de instrumentos do que aconteceu”, diz Lane
O mapa do fundo do mar não só proporcionou aos pesquisadores uma melhor compreensão sobre a erupção em Hunga Tonga-Hunga Ha’apai, como também contribuiu para um projeto maior: o Seabed 2030, uma iniciativa global dirigida pela Fundação Nippon que visa mapear todo o fundo do mar.
O mapa pode ajudar a identificar ecossistemas importantes ou vulneráveis, diz Spain. As informações coletadas também podem contribuir na recuperação do oceano e o ambiente marinho circundantes. Para um lugar como Tonga, onde cerca de 82% da população está envolvida na pesca de subsistência, é vital compreender os impactos das erupções na vida aquática.
“Não sabemos o suficiente sobre o oceano e nossos impactos sobre ele. Mapeá-lo, observá-lo e compreendê-lo, portanto, é incrivelmente importante”, opina Spain.